PROFANAS EPIFANIAS EM CONTOS DE A VIA CRUCIS DO CORPO, DE CLARICE LISPECTOR
Resumo
No presente ensaio, parto da leitura dos contos inseridos em A via crucis do corpo (1974), de Clarice Lispector (1920-1977). Desenvolvo um estudo analítico do conto “Miss Algrave”, tendo em vista as relações entre o sagrado e o profano, que envolvem o ritual da eucaristia e a via crucis de Cristo, parodiados nesse livro e estendidos a uma dimensão profana, que abarca as vias crucis de personagens despidas dessa ordem do sagrado. A partir dos pressupostos de Greimas, acerca das experiências estéticas, descrevo os símbolos presentes no ritual de transformação de Miss Algrave. Tal como nos demais contos de A via crucis do corpo, em “Miss Algrave”, o sujeito se depara com componentes recalcadas de sua personalidade. As estruturas de recalque, presentes em contos de Laços de família (1960), também serão contempladas neste trabalho. Essas estruturas são substituídas pelo afloramento de uma sexualidade que transborda os limites impostos pela sociedade patriarcal dos anos de 1970. O exame das condições de produção do discurso ficcional de A via crucis do corpo toma como corpus três contos de viés autobiográfico, nos quais verifico a presença de estruturas ensaísticas de uma consciência autoral preocupada em romper os grilhões que prendem o feminino no espaço privado.